segunda-feira, janeiro 30, 2006

As Dicas de Pedrito Bodega – A Conta-Gotas

A cultura Moitense está de parabéns. Entre um filme realizado pelo japonês Sako Guito, radicado na Albânia há 30 anos, sobre a puberdade e a descoberta do corpo no feminino e a leitura de trechos da lista telefónica do Madagáscar na letra j e k, assistimos a um concerto simplesmente notável. Foi qualquer coisa de extraordinário. Chegou a ser comovente assistir ao vibrar dos cerca de 5 a 6 espectadores entusiastas da música alternativa, que ali estiveram.
O auditório Toiros e Campinos viveu o seu momento máximo de rochosa intelectualidade, cheio de revivalismo e de pura magia cultural.
Uma banda do outro mundo, recheada de talento e imaginação proporcionou durante 3 horas (até os homens da Câmara virem cortar a água) momentos de ilusão e esplendor musical. Falamos dos Ping Fluido. Quatro jovens, 3 tocadores de torneiras e um A.J. (Alguidares Jockey). A fórmula é simples, com três torneiras pingando água ao sabor da cuidadosa cadência decidida e controlada pelos três estranhos percussionistas, o 4º elemento, qual génio da coreografia e do ritmo, muda os alguidares (eram cerca de 14 alguidares de diversos tamanhos) debaixo das torneiras criando loucas melodias. Simplesmente genial!!!!! Pouco mais há a dizer…

sexta-feira, janeiro 27, 2006

Inside Patanisca Tour - A Fonte dos Milagres

Quando naquela manhã cinzenta, o 6 dos Colectivos do Barreiro parou na Av. das Privatizações, para me transportar até àquele lugar de culto, senti o céu abrir de forma majestosa.
Impressionei-me com a imagem que vislumbrei assim que entro no autocarro. Estava apinhado de crentes, ansiosos por dar remédio aos seus males.
Esta peregrinação, da qual eu era agora um fervoroso participante, levar-nos-ia ao terreno dum idoso, de nome Tio Bento, que se situava lá para os lados do Cabeço Verde. Acredita-se que nesse local, há muitos séculos atrás, o deus Baco construiu uma fonte por onde brota vinho tinto alentejano. Diz-se que é vinho milagroso. Há quem garanta que ali foram curadas micoses, impotência sexual, gripes e até dor de burro. Vozes dissidentes asseguram que Tio Bento canalizou a fonte, ligando-a a um reservatório cheio de vinho, escondido numa casota de madeira na extremidade sul do terreno. Por cada golada na Fonte, o velhote cobra 2 euros. Ver apenas a Fonte são 50 cêntimos (tirar foto ou filmar são mais 50).
Eu trazia uma garrafa de plástico de litro e meio, com o intuito de a encher. Iria gastar uma fortuna, mas era por uma boa causa. Rebel Seducer faltara ao último concerto realizado da Patanisca Tour. O SMS que recebemos dele dizia: “Malta, hoje não vai dar, tenho uma unha do pé encravada”. Foi difícil fazer o concerto sem ele. Mas lá arranjámos um substituto à altura: o Américo da Casa dos Frangos. Embora por vezes se desequilibrasse em cima do atrelado e não soubesse tocar guitarra, conseguiu assar coiratos e febras com aceitável desenvoltura.
Infelizmente a garrafa de plástico cheia de tinto milagroso nunca chegou ao destinatário. O nosso vocalista “confiscou-a”.
O poder curativo da pomada ficou por provar. Ao que consta Crazy Charm não sofria de nenhuma maleita que pusesse o estranho elixir à prova.

quarta-feira, janeiro 25, 2006

Parabéns ao Charm

Foi num fim de tarde cinzento que aquele tipo, de estilo inconfundível, se me deparou pela frente. Travava-se no seio da banda (na altura apenas eu e o Stylish) um debate sobre o rumo a tomar. O nosso ponto de encontro habitual era o Barco do Barreiro, na proa, primeiro andar, local normalmente ocupado por estudantes, cromos, músicos, poetas populares, contadores de anedotas e bêbedos. Nós éramos na altura uma saudável mistura de tudo isso.
Crazy entrou acompanhado por uma moça bem apessoada. Reparou em nós. Reconheceu-nos. Tentou escapulir-se. Sentiu que correria perigo se chegássemos à fala com a rapariga. Em vão. Eu e Stylish que conhecíamos a catraia, fizemos com que se sentassem junto a nós. Crazy ficou possesso. Estávamos a estragar-lhe o “caldinho”.
Não gostei dele. Ele também não gostou de mim. Foi preciso, semanas mais tarde, um encontro cultural com “Facadas” Canhoto e Zé Caxias, em que ambos participamos, regado a copo 3 e Moscatel, para nos tornar-mos amigos inseparáveis. Daí até à entrada na banda foi um passo…
Pois bem… o Crazy Charm, voz de rouxinol, senhor do Estilo, palitador de dentes compulsivo, comedor de azeitonas, Vice-Rei da Fonte da Prata, faz hoje anos!!!
Deixo-vos com um texto por ele escrito à tempos, já que o gajo anda ocupado demais para publicar alguma coisa nova por estas bandas…
Parabéns … meu trambolho com dois olhos!!

“Kamacharme, por Crazy Charm

Inicio hoje um curso online sobre o sexo: “Kamacharme, por Crazy Charm”. Embora seja um curso sobre sexo, é preciso considerar que o curso reinventa a arte e os modos da prática sexual corrente. Trata-se de um meltingpot de sensações atingindo e abrangendo todos os sentidos: o tacto, a visão, o paladar e o olfacto. Levando a alma e o corpo a atingir estágios nirvánico-orgásmicos.
Prolongar o clima
Após fazer o amor, os parceiros que se preocupam genuinamente um com o outro desejarão prolongar a intimidade que só o amor traz, ficando próximos, emocional e fisicamente. É uma óptima altura para a mulher cortar as unhacas dos pés do seu parceiro enquanto este puxa de um cigarro e se põe a cantarolar a "Casa da Mariquinhas". É importante que os parceiros discutam o que mais apreciam acerca do seu relacionamento sexual, e se sentirem livres para dizerem um ao outro se existe algo que gostariam de mudar na maneira de fazer o amor. Por exemplo: “oh filha isto foi bom, mas para a próxima lava a passarinha, porque cheiras a sandes de coirato”. É frequente um casal querer repetir a dose, nesse caso, e se a mulher ainda tiver forças para continuar a lavoura, deve masturbar o parceiro para provocar nova erecção. Se os parceiros não pretendem retomar o acto, mas a mulher não conseguiu um clímax satisfatório, então é porque o homem não leu o Kamacharme.

Ajudando-a atingir o orgasmo
Se a sua parceira não atingiu pelo menos por 25 vezes o clímax durante o acto sexual, ou se deseja ter mais orgasmos, mas um gajo ainda não está pronto para fazer o amor de novo, ou seja, está na pausa dos 5 minutos para uma imperial, ajude-a usando os seus dedos para estimular o clítoris, passando-os delicadamente pelas laterais e pela ponta.

Escrito por Crazy Charm”

segunda-feira, janeiro 23, 2006

Crónicas do Zé Caxias – Reforço de Inverno

Há tempos que andávamos de olho no guardião do Fidalguinhos Sport. O nosso titular, o “Tocas”, não tem treinado o suficiente. Ao que parece a mulher não o deixa vir mais de duas vezes por semana aos treinos, por forma a garantir performances mais elevadas noutras “modalidades”. Por outro lado há ainda a ineficácia da outra opção disponível, uma botija meio vazia de gás propano, que devido à baixa estatura nos leva a sofrer imensos golos de chapéu.
Após “apalparmos” o mercado, concluímos que as opções não eram vastas. Na realidade, apenas Juca Cotão mostrou interesse em negociar connosco a sua transferência para o Fonte Pratense. Demoraram pouco as negociações. Bastou um jantar de convívio para que tudo ficasse acertado. Na presença do Presidente do Fidalguinhos, do próprio Juca e de mim, foi assinado o acordo que vem beneficiar todas as partes. Juca fica com a possibilidade de representar um clube de grande dimensão e com bebidas à descrição na sede do clube, o Fidalguinhos Sport fica com a opção de compra do jogador, com 8 grades de cerveja e com um jantar convívio a realizar na nossa sede, e nós, claro, ficámos com um excepcional jogador, que com 37 anos e enorme margem de progressão é uma grande esperança para o futuro da Instituição.
Gostava apenas de vos mostrar, e para que vejam que as coisas foram feitas com o máximo de profissionalismo, o relatório escrito pelo nosso treinador, “Facadas” Canhoto, relativo ao jogador em questão.

“O jogador é essencial à estratégica da Equipa. Dotado de enormes capacidades atléticas, estampadas no seu 1,65 m e 92 quilos de peso, é capaz de arrotar o seu nome completo após a ingestão duma imperial. Não sendo forte a jogar com as mãos, é dotado de um razoável pontapé, arma que considero importante na nossa táctica 4-3-2, especialmente quando o Shaka joga a ponta de lança e descaí para fora da linha lateral. Devido à sua grande versatilidade, pode ainda ser utilizado como ajudante de roupeiro, transportador de macas, ou apanhador de sabonetes nos balneários. Compro!!!!!!!”

sexta-feira, janeiro 20, 2006

Voz Difusa

Foto de António Azevedo


(A Outra Face do Canto Insano)

Cantava eu, num melodioso timbre próprio dos rouxinóis, quando a Besta vem até mim. Qual Minotauro, de olhos vermelhos de raiva, tronco poderoso e mãos grosseiras. Faz-me perder as forças de medo e estatelar-me a seus pés, de joelhos, completamente à sua mercê. Gritei de raiva, de pavor, de ânsia. Então as forças que me restavam escoaram, fazendo-me desfalecer ali mesmo.
Quando volto a mim estou a três metros de altura com as suas mãos pestilentas no meu pescoço. Comecei a rezar em voz alta. A Besta ruge algo imperceptível e eu sou projectado contra o vidro que separa a régie do estúdio. “Mas que raios!!”, pensei eu, “ como é que este animal entrou cá dentro pá?”, “logo agora que isto até estava a correr benzinho!!” Senti vontade de chorar. O gajo estava a destruir o estúdio e de seguida iria por certo destruir-me a mim. Agora é que iam ser elas, acabara-se o sonho de vir a ser uma estrela do charming punk fado.
- Fica quieto – Exclamou ele com uma voz gutural. – E vê se te calas. A tua voz de cana rachada começa a enervar-me. Se me irritas lanço-te um feitiço e deixas de ver, de ouvir, até de pensar. Transformo-te num ser rastejante.
Chorei e ri em simultâneo, tal qual uma mulher da vida. Era irónico!!! A oportunidade ali e aparece um Ser Mitológico, com um belo par de adornos de marfim e estraga-me tudo. A lei de Murphy é lixada.
Fiquei quieto por um momento, ele também. Olhei-o mais atentamente e reparei que me fazia lembrar alguém que conheci em tempos… mas eu não queria acreditar que era ele.
Ordenou-me que me levantasse, que fosse com ele. Fiz ouvidos moucos e fechei os olhos. Então a criatura prendeu-me numa camisa de forças e disse-me para não me mexer, que depois me viria buscar para me levar com ela para os confins do Inferno.
Adormeci. Dormi profundamente e ouvi aquela estranha voz nos meus sonhos.
Acordei de manhã, na rua… no outro lado da cidade, imerso em caixas de papelão, dentro de um outro corpo.
Sim, porque aquele tipo do outro lado do espelho não era o Eu que aprendi a ver.

Outra Voz Difusa…nas Ruas sem Nome

quarta-feira, janeiro 18, 2006

Inside Patanisca Tour – Com amigos assim…


Realizavam-se os preparativos finais para mais um grande concerto. O depósito encontrava-se atestado, os fardos de palha já estavam fora do atrelado e as colunas de som ligadas, faltava apenas convencer o Sexy Sparks a guiar o tractor.
Já não sei bem de onde, surgiu-me aquela carta. Inicialmente julguei tratar-se de mais uma fã da banda em êxtase, mas não. Ao abri-la deparei com uma folha recheada de letras recortadas de revistas e coladas ali para o efeito. O texto continha uma ameaça feroz: “Se vocês cantarem o Out of Charme, o Talk Talk leva com um repolho encharcado em vinagre num olho.”
A GNR do Bairro Alentejano tomou nota do ocorrido e decidiu levar a sério a ameaça. Três dúvidas me surgiram na altura. De quem seria a ameaça? Porque é que era feita? E porque é que eu era o principal visado?
O cabo Simões, dotado de elevada perspicácia conseguiu responder-me à última questão: “Senhor Talk, você é o alvo mais fácil, é o mais alto e a sua cabeça ocupa mais espaço do que a esmagadora maioria dos elementos da banda!”.
A forma discreta com que o guarda me chamou cabeçudo quase me comoveu. Após alguns minutos de diálogo com os restantes membros chegámos à democrática decisão (com dois votos a favor, uma abstenção e o meu voto contra) que deveríamos tocar a música.
E assim o fizemos. É habito fechar os olhos durante as performances e ficar ali a curtir, apenas eu e o meu baixo, numa simbiose perfeita. Assim o fiz no Out of Charme. Senti-me só, só como nunca, naquele atrelado imenso percorrendo as ruas dos Brejos da Moita. Por um momento abri os olhos e… e a banda estava fora do atrelado, seguindo no habitual cortejo atrás do tractor, protegidos por tampas de panelas que os guardas da GNR, que nos acompanhavam, transportavam.
Foi então que o vi. Qual projéctil lançado de um canhão, percorrendo os ares na direcção do seu alvo, a minha cachimónia. Agilmente, tomei a iniciativa de realizar movimentos defensivos. Tarde de mais. Aquele monstro herbáceo embateu em cheio no meu olho esquerdo, criando um brutal hematoma que demorou mais de dois dias a desaparecer.
Nunca apanharam os malfeitores. Andam concerteza por ai à solta, a ameaçar os cidadãos com repolhos e quiçá couves francesas. É a sociedade em que vivemos!!

segunda-feira, janeiro 16, 2006

Glamour no Olhar – 2º Episódio

Cai a noite na Mata da Machada. Apenas se ouvem os grilos, as cigarras e as descargas das fábricas do Barreiro lá ao longe. “Bolinhas” e Rodú sentam-se à mesa para jantar na sua humilde cabana. Batem à porta de forma brusca. Rodú vai abrir a porta e ao fazê-lo revela um olhar de grande admiração…

Belchior tornou-se independente de Dona Maria, sua mãe adoptiva, vivendo agora no Pinhal Novo com Gina, uma mulher 10 anos mais velha. Visita-a religiosamente todos os sábados à tarde sem o consentimento da namorada. A senhora continua a viver no sitio onde o criou, numa rua estreita do Barreiro Velho. Belchior desconhece as suas origens, nem imagina que tem um irmão gémeo e muito menos que é adoptado.

Gina é má como cobras e boa como o milho. É ela quem comanda as operações lá em casa. Adora sexo, roupas, malas e ir ao cabeleireiro. Detesta a sogra, os amigos do namorado, o campo e açorda de marisco. Guarda um segredo antiquíssimo, tão bem guardado que nem o autor desta Blognovela sabe ainda qual é.

O olhar de espanto de Rodú desfaz-se e transforma-se num sorriso largo e tranquilo. É Du Frak que entra na cabana, não sem antes bater com os queixos numa viga de madeira situada sobre a porta.
- Viva Frak!! Há quanto tempo! – Disse Tio “Bolinhas”.
- Olá pessoal. É pá… quando é que levantam a porra da viga?
- O que te trás por cá? – Perguntou o jovem Rodú.
- Venho ver se está tudo bem. E também trago novidades.

Dona Maria aguardava ansiosamente pela chegada do filho. Era hora de lhe contar a verdade sobre a sua família. O segredo atormentava-lhe a alma. Pontual como sempre, Belchior chegou a casa da mãe. Vinha sozinho e com ar abatido.
- Que se passa meu filho?
- Oh minha mãe… não é nada de especial. Apenas o costume. A Gina não me dá um minuto de descanso. Por ela eu nem me levantava da cama…
- Bom… - Interrompe Dona Maria um pouco envergonhada. – Vamos mudar de assunto. Tenho algo para te contar, muito importante. É sobre as tuas origens…

quinta-feira, janeiro 12, 2006

Balanço do Patanisca Tour

Terminou mais um “On the Road” da nossa emblemática banda. Desta feita trata-se da digressão mundial Patanisca Tour. Após meses a fio ao longo das estradas da nossa amada região, chegou a hora de se fazer o balanço geral. Em números redondos temos:
  • Mais de 35 espectadores;
  • Cerca de 100 concertos;
  • Mais de 700 quilos de coirato distribuídos à população;
  • 21 queixas por excesso de ruído;
  • 14 tentativas de agressão do público a membros da banda;
  • Incontáveis toneladas de cascas de tremoço, laranjas, isqueiros, papeis molhados, apanhados do palco, ou seja, de cima do atrelado do tractor.

Deixo-vos agora com uma das mais simbólicas músicas da banda, não sem antes vos alertar para o facto de neste dia a voz do Crazy Charm estar… digamos… enfim… É o que faz comer azeitonas regadas em Sonasol.






Out of Charme

De manhã na Tasca
A beber um vinho rasca
E a comer um coirato
C´até me soube a pato

Apanhei um bezana
E comi à fartazana
Comi até rebentar
Gases tive que soltar

O cheiro era tal que estoirou o alarme
A malta protestou, eu estou Out of Charme

Malta tenham calma
O cheiro purifica a alma
Podia ter sido pior
Se fosse o Talk o infractor

O cheiro era tal que estoirou o alarme
A malta protestou, eu estou Out of Charme

Na Tasca do Azedo
Tens um cu que mete medo
Mas que cu debochado
Vai-te cagar pra outro lado

Eu quero sair daqui
Quero o charme que perdi
Ao glamour eu vou voltar
Não me vou mais peidar


O cheiro era tal que estoirou o alarme
A malta protestou, eu estou Out of Charme

terça-feira, janeiro 10, 2006

Canto Insano

Foto de Diego Canhas

Foi quase cruel dar com ele de joelhos, com uma garrafa de whisky de Alverca seu lado, a gritar como um desalmado palavras imperceptíveis.
Fixei-o com o olhar. Ele mal deposita os seus olhos em mim desfalece e o seu corpo cai sobre a frieza do asfalto. Então fiz o que qualquer amigo faria numa ocasião daquelas: coloquei-o em pé e comecei a tentar reanimá-lo.
Abanei-o ligeiramente enquanto chamava pelo seu nome. Nada. Depois de forma mais frenética. Bingo. Abriu os olhos e recomeçou com a chinfrineira.
Mas os seus gritos eram tais que o larguei de novo. Aquela voz esganiçada que outrora encantara multidões, mais parecia agora uma broca de dentista a massacrar-me os ouvidos. Mal os seus pés tocaram no chão atirou-se em moch para cima dumas caixas de papelão.
Estendi-lhe a mão para o ajudar a levantar-se. Recusou a ajuda e exclamou que eu tentara assassiná-lo, ouvira a minha voz na sua mente. Essa doeu. Magoado com toda esta situação disse-lhe:
“É o álcool a falar, não tu. É o que te safa, senão íamos ter chatices. Que te deu para beberes essa trampa? Isto até faz mal à mioleira. Ouvi dizer que quem apanha uma carraspana desta mistela pode deixar de ver, de ouvir, até de pensar. As pernas ficam dormentes, rasteja-se durante 3 dias.”
Senti-o mais calmo. Bem mais calmo. Num gesto brando despeja o que resta da garrafa na mão estendida e começa a chorar que nem um desalmado. Ao vê-lo assim acrescentei então:
“Vá amigo… levanta-te. Estende a tua mão para eu te ajudar. Vou levar-te a casa.”
Recusou. Fechou os olhos e adormeceu. O seu ressonar mais parecia um motor de camião. Deixei-o ali a descansar. Tapei o seu corpo com o meu casaco. Parti sem mais demoras. Por hoje tinha terminado o fado vadio. A vizinhança poderá dormir descansada no que resta da noite.

Outro Canto Insano…nas Ruas sem Nome

segunda-feira, janeiro 09, 2006

Glamour no Olhar – 1º Episódio

Viajámos no tempo até 1980. Quequita Martins, filha do Comendador, dá à luz duas crianças. A gravidez tinha apanhado todos de surpresa e não era consentida pela família. As crianças são separadas à nascença. Uma é entregue a Dona Maria, antiga governanta da casa do pai de Quequita. O outro petiz é levado pelo seu padrinho, Yeti Du Frak e por seu tio, Quim “Bolinhas” e é criado na Mata da Machada em contacto permanente com a natureza.

O pai dos petizes permanece incógnito até aos nossos dias. Quequita chamais revelou qual dos seus quatro namorados da época a engravidou, ela própria tem algumas dúvidas, pois se por um lado a matemática nunca foi o seu forte, por outro não foi 100% fiel aos quatro.

Rodú é agora um rapaz com 25 anos. Viveu feliz durante todo este tempo na floresta entre o rio Coina e a via rápida, afastado da civilização. O contacto com o mundo exterior é dado pelos relatos de seu tio e por Du Frak. O seu sonho é ir até ao grande rio ao norte e vislumbrar a grande cidade.

Quim “Bolinhas” Martins é tio avô de Rodú, sendo meio-irmão do Comendador. Sonhava em ser travesti, mas o aspecto grosseiro e a voz à Tom Waits, tornaram o sonho em pesadelo. Vive feliz com Rodú na Mata da Machada. Aos Domingos de manhã, deixa o sobrinho na lavoura e parte para a Feira com a sua melhor roupa, um vestido creme com flores lilases. As bolas de ténis, presas a um cordel enrolado no pescoço, que ele coloca no peito debaixo das roupas, deram-lhe a alcunha de “Bolinhas”.

Du Frak é um Yeti, que por amizade para com Quequita, acedeu a ser Padrinho de Rodú. Trabalha para os guerreiros Niitsumy. A sua função é viajar pelo mundo cobrando as cotas de associado dos guerreiros. Veste chapéu de cartola, sapatinho preto e fraque. Anda sempre com uma bandeja na mão. É conhecido no meio por Cobrador Du Frak.

Mata da Machada, ano de 2005. Apenas se ouvem os grilos, as cigarras e as descargas das fábricas do Barreiro lá ao longe. “Bolinhas” e Rodú sentam-se à mesa para jantar na sua humilde cabana. Batem à porta de forma brusca. Rodú vai abrir a porta e ao fazê-lo revela um olhar de grande admiração…

sexta-feira, janeiro 06, 2006

Blognovela – Glamour no Olhar

Não há canal televisivo que não sobreviva à guerra de audiências sem, entre outras coisas, as novelas. Fazendo a extrapolação para a Blogosfera, e com o anseio de aumentar as audiências do Blog I-Glamour é grande, tomei a decisão de criar neste espaço uma novela.
E como qualquer novela que se preze terá os seguintes ingredientes:

  • Gajas giras más como cobras;
  • Gajas giras boazinhas e sofridas;
  • Enredos familiares compreensíveis apenas com uma árvore genealógica desenhada num papel;
  • Título que nada tem a ver com o enredo;
  • Momentos escaldantes;
  • Fim prolongado até à exaustão com o intuito de combater eficazmente o inicio da novela no Blog concorrente;

Claro que muitos de vós se questionarão agora: “Então mas que raios… o Talk, um charming punk rocker, anda a ver novelas? Só assim é que ele seria capaz de escrever uma, certo?”.
Calma amigos!!! Eu não ando a ver novelas, apenas comecei a estudá-las com o intuito de adquirir traquejo para a tarefa a que me proponho. Vejo-as apenas num sentido meramente profissional.
Não percam o primeiro episódio de “Glamour no Olhar” num Blog aqui bem perto.

quarta-feira, janeiro 04, 2006

As Crónicas do Zé Caxias – Bom Ano para todos

Pois é amigos… o Novo Ano bateu à porta e entrou. Mas a questão que coloquei a mim mesmo, enquanto estava na casa de banho a “despachar papelada”, é pois duma importância extrema, digna de ser pensada pelas mais altas patentes académicas. Mas afinal porque é que se comemora o fim do ano velho e a entrada do novo?
À medida que o “despacho” ia sendo feito e enquanto palitava os dentes fixos que me restam, com uma navalha que me emprestou o Chico Barbeiro, cheguei à seguinte conclusão: Não faço a mínima ideia porque raio se comemora o fim do ano.
Mas isso também não é importante. O que importa mesmo é festejar.
Foi com essa intenção que juntámos um grupo de amigos no Armazém do Ti’Bezana. Faltavam 5 minutos para as 4 da tarde de dia 31 e já a ambulância dos Bombeiros Voluntários da Baixa da Banheira, estacionava à porta do Armazém para a sua segunda viagem até ao Hospital do Barreiro: Zé Cotão não resistiu à mistura de vinho com filhós. Uísqu’em Pé , sem a pedalada de outros tempos e com rotina noutras especialidades, tombou à terceira garrafa de água ardente.
Eu resisti até ao fim da noite, mantendo a dignidade da posição que ocupo como pretendente ao trono da Ilha do Rato, comendo e bebendo em fartura, dançando o KuDuro, fazendo a minha divertida imitação dos Cabeçones e cortejando as moças solitárias que por ali se encontravam.
Acabei por ser surpreendido pela quietude e pose principesca duma dessas moças. Não foi difícil convence-la a descer a escadaria metálica até à Adega. Experimentei sensações novas. Ela também. Creio mesmo que a levei ao arrebatamento. Mas no final algo de trágico e surpreendente aconteceu. Ti’Bezana, sentido a boca seca por estar à 10 minutos sem o gosto carrascão do vinho tinto, deslocou-se ao local onde, em puro deleite, eu e a moça nos encontrava-mos. Em fúria, fixando o olhar tenebroso em nós, exclamou:
- Caxias como foste capaz!!! A traíres-me com a minha boneca insuflável!
Fiquei sem reacção. Ela ainda tentou justificar-se mas eu não sabia o que dizer.
Um bom ano para todos.

segunda-feira, janeiro 02, 2006

Nos Primórdios da Intelectualidade

Darwin veio revolucionar o mundo com a ideia da Evolução. Mas estava longe de suspeitar o que aqui é revelado.
No Paleolítico superior, vagueando marialva, uma subespécie hominídea ditou leis. Era o Cro-Magnon Intelectus. Várias coisas o distinguiam do Cro-Magnon tradicional: era laico, possuía Abstractos Rupestres (quase sempre javalis em formas geométricas), vivia em espaçosas águas furtadas nas grutas mais in do clã e fumava tabaco importado em ossadas de Dinossauro preparadas para o efeito. Era também um incompreendido. Tantas vezes posto de lado pelos outros Cro-Magnon só porque não gostava do desporto rei da época, o conhecido Esmaga Crânio, onde multidões em euforia vibravam com as perseguições de moca que os atletas faziam a galinhas, perus e avestruzes.
O desporto de eleição desta raça pré-humana era o pedra-mind, uma ancestral forma de xadrez, em que o raciocínio e a estratégia eram essenciais. Peças de pedra, em forma de menires minúsculos, eram colocadas sobre uma espécie de mesa. Dois oponentes, cada qual com a sua moca, iam partindo minuciosamente as peças uma a uma, até que no final o oponente mais desenvolto decretava o xeque-mate e desferia um golpe na tola do outro oponente.
Acredita-se que esta subespécie possa ter sobrevivido até aos nossos dias, integrando-se nas populações humanas actuais passando quase despercebido. Quase. Não totalmente porque, para além das pernas arqueadas, dos ombros largos e de andar descalço pelas ruas, teima em ver a RTP2 em desfavor da TVI.