quarta-feira, novembro 30, 2005

O Código 14 – Capítulo IX

O barco a remos que os transportava para a Ilha do Rato era propriedade de Tia Albertina. Senhora de grandes virtudes, dona de casa a tempo inteiro, vendedora de jogo ilícito e atleta de levantamento de copo 3 nas horas vagas. A custo conseguiram convence-la a emprestar-lhes o batel. Aliás… a muito custo. Foram necessários 250 euros e a promessa de que o barco sobreviveria à viagem sob pena de serem severamente punidos fisicamente. Quando uma ameaça destas vem de alguém com 140 quilos, com pernas e braços facilmente confundíveis com troncos de árvore, deve ser levada a sério.
A maré subia rapidamente. Pedrito cadenciava a remada, procurando ignorar o cheiro a peixe, impregnado na madeira da embarcação, e os gemidos de Piaçá que começava a ficar almareado com o balanço provocado pelo rio.
Aproximavam-se da Ilha rapidamente. Alguns barcos de pescadores circundavam-na, muitos outros para ela se dirigiam. Era a romaria habitual ditada pela maré e pelo bom tempo. Fizeram o desembarque pela parte sul da ilha. O curto areal, repleto de mosquitos e cascas de canivetes serviu para se sentarem a retemperar forças e a definir estratégias.
- Fazes alguma ideia por onde devemos começar? – Questionou Pedrito Bodega ainda ofegante pelo esforço despendido.
- Faço. Pela casa em ruínas. Tudo o resto é areia, lodo e vegetação. Tem que estar ali.
Após o breve descanso, começaram a cortar caminho por entre a vegetação. A ilha não teria mais de 10 hectares. Na parte central existia o que restava duma pequena casota: a laje térrea em betão revestida com ladrilhos hidráulicos, algumas paredes de tijolo, destroços de mobiliário.
Entraram nas ruínas. O cheiro naquele local fazia o barco da Tia Albertina parecer um prado de flores num matinal dia de Primavera. As paredes estavam recheadas de alusões clubistas, juras de amor, frases de cariz político, símbolos erótico-pornográficos. Mas de todas as gravuras, houve uma que prendeu a atenção de Piaçá. A sigla dos Cavaleiros da Tasca, GCT, estava desenhada a tinta vermelha, na parede nascente, com uma seta apontada para o chão. Piaçá agarrou num pedaço de madeira, que teria sido em tempos a perna duma cadeira, e começou a bater na laje junto à parede onde estava a seta. O som oco indicava que havia ali algo. Entusiasmado bateu com mais força. O pau soltou-se da mão, batendo-lhe no pé direito. O incidente provocou-lhe imensas dores, iniciando então uma série de movimentos, que foram desde o saltar ao pé-coxinho, até ao cantarolar do “Fado do 31” deitado no chão, agarrado ao pé, como um futebolista após uma entrada mais dura. Pedrito Bodega decidiu agir. Agarrou o pau e ele próprio bateu naquela zona da laje. Com facilidade o ladrilho partiu e vislumbrou-se o que parecia uma pequena câmara circular com menos de 1 m de diâmetro. Após olhar para o seu interior, Bodega introduziu o braço direito apercebendo-se que, por entre pedaços cerâmicos e teias de aranha, a profundidade era de 50 cm. Reparou também na existência dum saco plástico com algo lá dentro. Fez emergir o saco. Era um saco do Feira-Nova duma campanha de Natal. Abriu o saco e tirou do seu interior uma caixa de sapatos (da Sapataria Tó-Zé) já meio deteriorada pelo tempo. O seu coração pulsava descontroladamente. Será que finalmente encontrara o que durante meia vida procurou?
O abrir da caixa de sapatos fez os olhos de Pedrito encherem-se de lágrimas. Piaçá, já menos dorido, rastejou até ele e olhou para o conteúdo da caixa. Estava revelado o segredo. O Graal estava ali, na Ilha do Rato: era uma pequena taça de cortiça. Junto à taça estava um manuscrito, com aspecto antiquíssimo, enrolado com uma fita doirada. Ao abrirem o manuscrito puderam ler:

Ó Pedrito foste apanhado
Tu e o lunático do Piaçá
É que o Graal foi comprado
Numa loja em Massamá


FIM

4 comentários:

Francis disse...

Presumo que ao beberem dele não ganharam a vida eterna :-)
Bom feriado!

Talk Talk disse...

Não francis. Mas como era de cortiça pelo menos não tinha micróbios.
Bom feriado.

Titá disse...

Genial!!!! Segui com um interesse quase fanático...eheheheh
Obrigada TAlk
Beijinho e bom feriado

Morfeu disse...

Mais um Final de uma "historia" para Oscar...
Esperamos pela próxima. Um abraço